Correr descalço é bom. Mas não é pra qualquer um

Talvez você já tenha lido ou visto algo a respeito de uma vertente de corredores que preferem deixar o tênis em casa e sair correndo descalços. Com base em estudos científicos e experimentos empíricos, eles dizem que os calçados esportivos com sola de borracha, bolhas de ar e incríveis molas de amortecimento fazem mal para as articulações, em vez de fazer bem. Um desses estudos, publicado no final do ano passado, comparou o que acontecia com os joelhos, tornozelos e quadris de corredores usuais quando praticavam o treino com um calçado de corrida padrão e sem nada nos pés. E, para a minha surpresa, os pesquisadores observaram que o impacto contra as articulações quando os sujeitos correram de tênis era maior.

A explicação é que o pé humano não foi feito para pisar no chão com força começando pelo calcanhar. Não na corrida. Quando a gente caminha, o movimento natural é apoiar o calcanhar, depois o metatarso e depois os dedos. Está correto. Quando a gente começa a praticar corrida devagar e com um tênis bem fofinho, normalmente pisa exatamente assim: calcanhar primeiro, dedos por último. Está errado. Correr assim destrói joelho. Grande parte das lesões de joelho, tornozelo e quadril associadas à corrida se deve ao impacto que o pé recebe do chão quando o calcanhar é o primeiro a chegar. E, de acordo com os estudos, a borracha, as bolhas e as molas não resolvem muita coisa nesse sentido. Eles sugerem que o que protege de verdade as articulações é uma pisada correta. Na corrida, isso significa mudar bastante a técnica do movimento para pisar primeiro com o metatarso e os dedos.

Os adeptos de correr descalço acreditam que o calçado esportivo atrapalha na correção da técnica e induz o praticante a pisar primeiro com o calcanhar. Até porque, por causa daquela borracha toda, não sentimos necessidade de pisar diferente. É tão confortável... A melhor maneira de educar o corpo a pisar direito seria, então, mandar esse conforto embora e deixar os pés sentirem na pele o que é que o chão duro tem a oferecer. Impacto, claro. Quando o pé desnudo bate no chão duro começando pelo calcanhar, a gente sente dor. Fica impossível correr assim sem se machucar. A reação automática é procurar um jeito de não sentir dor, e acaba-se descobrindo logo que a dor some quando a parte mais macia do pé bate no chão primeiro. Correr quase na ponta dos pés (digo quase porque não é mesmo pra chegar no chão só com os dedos; o meio do pé participa) pode ser confortável. Há maratonistas (ah, os quenianos...) cumprindo provas descalços. E estão aí, inteiros. Mas não é por acaso. O corpo deles está preparado pra isso.