França leva 3,7 milhões de pessoas as ruas

No primeiro domingo após o ataque ao semanário satírico "Charlie Hebdo", 3,7 milhões de pessoas tomaram as ruas de Paris e das principais cidades da França em uma manifestação sem precedentes na história do país para repudiar o terrorismo. Quarenta líderes marcharam juntos à frente da multidão na capital. Na primeira fila dos chefes de Estado, caminharam o presidente francês François Hollande, a chanceler alemã Angela Merkel, o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, e o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas. "Paris hoje é a capital do mundo", disse Hollande no palácio do Eliseu, antes de seguir para o ato público. Após uma lenta caminhada de 400 metros, Hollande saiu da aglomeração de chefes de Estado e caminhou até o centro da praça Leon Blum para cumprimentar os familiares de cada um dos 17 mortos nos ataques terroristas da semana passada. Hollande deu um longo abraço no médico Patrick Pelloux, um dos primeiros a chegar à redação do "Charlie Hebdo" após o massacre de 12 pessoas, na quarta-feira (7).

 A cena foi observada por parentes de vítimas que usavam faixas com a palavra "Charlie" na cabeça. Muitos choravam e se abraçavam. O líder francês foi também, no fim do dia, à Grande Sinagoga de Paris, acompanhado pelo premiê israelense -que havia levado à capital francesa a mensagem de que Israel é um porto-seguro aos judeus. As vítimas do atentado ao mercado kosher serão sepultadas em Israel. O aparato de segurança contou com mais de 5.000 policiais. Atiradores de elite foram posicionados nos telhados, policiais à paisana se infiltraram no meio da turba e dez estações de metrô foram fechadas na cidade. Moradores de edifícios no boulevard Voltaire foram proibidos de sair às sacadas de seus apartamentos enquanto os líderes internacionais passavam por ali. Metrôs e ônibus eram gratuitos em Paris. A organização situou o número entre 1,3 e 1,5 milhão de pessoas, enquanto muitos comentaristas afirmaram que a última vez em que os parisienses saíram tão massivamente às ruas foi em 1944, quando essa cidade foi libertada da invasão nazista. A manifestação de hoje foi um momento raro de reencontro de centenas de milhares de cidadãos comuns com os símbolos caros à história de seu país. Na praça da República, os manifestantes se espremiam balançando bandeiras da França, exibindo cartazes com capas do "Charlie Hebdo" ou lápis e canetas, simbolizando a liberdade de expressão. Muitas reproduções eram de desenhos da publicação considerados ofensivos ao islã e que foram citados como motivo ao ataque. A Marselhesa era entoada, aos gritos, espontaneamente numa reapropriação em massa do hino do país ultimamente executado, sobretudo, em solenidade oficiais ou nos atos políticos da direita moderada e da Frente Nacional. Convidado, o partido de extrema-direita não participou dessa marcha. Pela manhã, quando as pessoas começaram a chegar, um manifestante anônimo escalou o monumento onde estão as estátuas que representam os lemas da Revolução Francesa e retirou uma mordaça de fita adesiva que cobria a boca da Liberdade nesses últimos dias. "Estamos aqui para reivindicar o nosso direito a dizermos o que bem entendermos e sermos impertinentes. Mataram 17 pessoas e fizeram a República se levantar e dizer que o ódio é que deve ser proibido", disse a comediante Anne de Peufeilhoux. O mote "Je Suis Charlie" ("eu sou Charlie", em francês) foi adaptado em diversos formatos, durante a passeata. Havia "eu sou sírio", "eu sou judeu", 'eu sou policial" e o mais abrangente e mais no espírito da manifestação: "eu sou francês". Variações em hebraico e em árabe eram frequentes, ali. Um grupo de poucas dezenas de curdos caminhava comparando o atentado de quarta-feira (7) a sua luta no norte da Síria contra o Estado Islâmico. "Ambos são a barbárie em nome da religião", diz à Folha Fidan Unlubayir, do Conselho Democrático Curdo na França. Um homem carregando cartaz de "Charlie akbar" ("Charlie é maior", imitando a fórmula islâmica de "Deus é maior") causava controvérsia na praça da Nação. Um homem árabe lhe pediu que retirasse a mensagem. Outro, também árabe, lhe defendeu. Entre ânimos exaltados, a frase continuou na marcha.

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